segunda-feira, 15 de outubro de 2018

COMO O MONSTRO BOLSONARO FOI GERADO ?








 Traduzido por: Diego Lopes

Algo mudou domingo na política latino-americana. A imagem assusta: quase 50 milhões de brasileiros e brasileiras votaram em um projeto abertamente fascista. 46% do eleitorado do maior país da região (e o quinto do mundo) escolheu um candidato que reivindica a tortura e não pede desculpas pela ditadura, que exibe uma retórica odiosa, sexista, racista e homofóbica que promete armar a população e privatizar empresas estatais. Seu filho se tornou o deputado mais votado da história do Brasil.

O refortalecimento da direita pura e dura já se acentuava com os Macri, Piñera, os próprios Temer, Mario Abdo, Ivan Duque e vários outros. Mas o surgimento de um troglodita de ultra-direita que consegue conquistar uma enorme base social - um experimento que foi instalado nos EUA com Trump e que se estende para a Europa - é um romance emergente na América Latina que nos pertuba. E faz ligar todos os alarmes.

O Brasil estava à beira do abismo. E além das urgências que enfrentam o segundo turno, é hora de desvendar o roteiro inteiro antes do retorno do obscurantismo. Como foi criado esse fenômeno político, sociológico e até religioso chamado Jair Messias Bolsonaro ? 

O triunfo dos "antipolíticos" ou a política do ódio 

Para entender esse tsunami político, é necessária uma retrospectiva de longo prazo. Um país cuja independência foi proclamada por um príncipe português, que não passou por processos revolucionários, cuja última ditadura durou 21 anos e teve uma saída bastante consensual, deu origem a uma sociedade historicamente despolitizada. Mas esse sentimento "anti-político" foi novamente promovido nos últimos anos, estimulado pela operação Lava Jato e pela grande mídia. Após o golpe institucional que derrubou Dilma em 2016 e a péssima administração de Michel Temer, a putrefação do sistema político tornou-se evidente e foi imposto um senso comum de rejeição da classe dominante. De fato, as principais vítimas da eleição de domingo foram os dois principais partidos do establishment: o PSDB, cujo candidato Geraldo Alckmin não chegou a 5%, e o MDB de Temer, que indicou Henrique Meirelles e obteve escassos 1,2%. 

 Mas esse processo teve como ingrediente central uma forte campanha de demonização midiática e judicial contra o PT, que permitiu associar a epidemia de corrupção unilateralmente a essa força política e socialmente justificar a prisão irregular e a proibição de Lula.

Nesse contexto, surge esse ex-militar desconhecido que consegue capitalizar a implosão dos partidos de direita e de centro-direita, a consolidação desse forte sentimento anti-PT e a aguda crise econômica que alimentou o tédio. Como a política abomina um vácuo, Bolsonaro aparece como o candidato anti-sistema - porque ele é um deputado há 28 anos - que promete resolver essa crise multidimensional pela força de uma mão forte e pela pregação messiânica. E de ser um legislador marginal, que ganhou fama quando jurou pelo militar que torturou Dilma, tornou-se o efeito mais sinistro desta democracia moribunda.

O fundamentalismo religioso

 Você não pode entender esses 50 milhões de votos sem a militância ativa exibida pela poderosa Igreja Universal do Reino de Deus. A força evangélica neopentecostal - que joga cada vez mais no terreno político em toda a região - ataca três frentes simultâneas: no Congresso, onde "a bancada da Bíblia" controla a quinta parte da Câmara dos Deputados; nos meios de comunicação de massa, com o seu recorde de audiência, o segundo do país, diminuindo a distância para a Rede Globo; e nos bairros populares, onde tem uma penetração territorial grande.

Talvez parte da ascensão abrupta de Bolsonaro seja explicada pelo envio de milhares de pastores que lutam furiosamente pelo ex-soldado nos dias que antecederam a votação.


As outras três pernas da mesa 

Outro fator fundamental na construção do consenso em torno de Bolsonaro foi a grande mídia, que acabou aceitando o mal menor em face da irreversível polarização com o PT e do fracasso dos candidatos da ordem. As notícias do destino antipetistas se multiplicaram nas últimas semanas e causaram estragos nas redes sociais. Algo semelhante aconteceu com o poder empresarial e financeiro, que também fechou fileiras com Bolsonaro. Não é de admirar: seu guru econômico é Paulo Guedes, um garoto de Chicago que garante um curso ultraliberal.

Finalmente, o crescente poder do chamado "Partido Militar", que neste domingo quadruplicou sua presença ao ritmo do fracasso da política tradicional. Além de Bolsonaro e seu companheiro de chapa, o inefável general Hamilton Mourão, pelo menos 70 candidatos militares foram eleitos e três vão disputar governadores estaduais no segundo turno.
 


Os limites do progressismo 

O PT também merece refletir sobre sua responsabilidade na despolitização da sociedade brasileira e na criação do Frankenstein Bolsonaro. Por 12 anos, houve uma falta de audácia para avançar com transformações de raizales, como a muito exigida reforma política ou uma lei que limitaria a concentração da mídia. E acima de tudo, o empoderamento popular e a formação político-ideológica não se aprofundaram, facilitando a disseminação de valores retrógrados e autoritários.E uma vez fora do Palácio do Planalto, o progressismo brasileiro se contentou em dar a luta quase exclusivamente nos andaimes institucionais. Exceto pela mobilização permanente dos movimentos populares, a estratégia PT foi presa na teia de um sistema democrático controlado pelos meios de comunicação pró-golpe, religiosa, militar e financeiro.Talvez na resposta de rua das mulheres brasileiras e seu poderoso slogan # EleNão você possa encontrar algumas pistas de como enfrentar os profetas do ódio e seu monstro Bolsonaro.

CUBADEBATE


 

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